As teorias por trás da associação de azar com o número 13 incluem o número de pessoas presentes na Última Ceia e o número de bruxas em um clã. ‘Friday the 13th’, de Lawson, conta a história de um corretor da bolsa de valores que escolhe esse dia para acabar com Wall Street
Getty Images via BBC
Você sofre do medo de sexta-feira 13? Pois parte da culpa é de um financista americano do século 19 chamado Thomas W. Lawson.
Embora a superstição seja muito antiga, creditam a ele o feito de ter fixado a data na consciência moderna com seu romance Sexta-feira 13, que conta a história sombria de um corretor de Wall Street que manipula o valor de ações para se vingar de seus inimigos, deixando-os na miséria.
Sexta-feira e o número 13 já eram associados ao azar por si só, segundo Steve Roud, autor do guia da editora Penguin Superstições da Grã-Bretanha e Irlanda.
“Porque sexta-feira foi o dia da crucificação (de Jesus Cristo), as sextas-feiras sempre foram vistas como um dia de penitência e abstinência”, diz ele.
“A crença religiosa virou uma aversão generalizada a começar algo ou fazer qualquer coisa importante em uma sexta-feira.”
Por volta de 1690, começou a circular uma lenda urbana dizendo que ter 13 pessoas em um grupo ou em torno de uma mesa dava azar, explica Roud.
As teorias por trás da associação de azar com o número 13 incluem o número de pessoas presentes na Última Ceia e o número de bruxas em um clã.
Até que esses dois elementos, a sexta-feira e o número 13, que já causavam receio isoladamente, acabaram se unindo — justamente com o livro de Thomas W. Lawson.
Mas a associação da data com Lawson não para por aí. Diz a lenda que alguns meses depois de publicar seu romance, mais precisamente na sexta-feira 13 de dezembro de 1907, um enorme barco que ele havia mandado construir e que levava o seu nome afundou.
O naufrágio aconteceu, na verdade, nas primeiras horas do sábado, dia 14, mas em Boston, onde Lawson vivia, ainda era sexta-feira 13.
O navio era o maior veleiro já construído sem uma máquina de propulsão. Ele transportava cerca de 60 mil barris de óleo leve quando afundou e o vazamento que causou é considerado o primeiro grande desastre ecológico do tipo.
A ligação de Lawson com a sexta-feira 13 foi apenas um dos motivos que o tornaram inesquecível. Outro é que ele nasceu e morreu na pobreza, depois de ter sido, no meio do caminho, um dos homens mais ricos dos Estados Unidos.
Manipulador financeiro
Lawson nasceu em 1857 em Charlestown, Massachusetts e, quando criança, perdeu o pai, um veterano da Guerra Civil que morreu em decorrência de ferimentos que havia sofrido.
Aos 12 anos, ele se viu forçado a trabalhar e conquistou uma vaga como mensageiro em um banco em Boston. Lá, começou a nutrir a ambição de se tornar rico.
Ainda muito jovem, ele se especializou na compra e venda de ações, e historiadores contam que ele tinha um talento excepcional para escolher os títulos que mais se valorizariam.
Mas sua fortuna seria construída de maneira questionável: usando seus conhecimentos para manipular os mercados financeiros.
Lawson se especializou em mineração, especialmente no mercado de cobre, já que Boston era o centro financeiro dessa indústria.
O boom do cobre no final do século 19 o ajudou a se tornar multimilionário.
Mas enquanto ele ficava rico, muitos dos clientes a quem assessorava perdiam enormes somas de dinheiro, o que fez dele um dos mais controversos “barões ladrões” da chamada Era Dourada.
‘Amalgamated Copper Company’
Um de seus primeiros fiascos foi a orientação de investir nas minas de ferro de Grand Rivers, em Kentucky, que acabaram sendo um fracasso.
Mas seu negócio mais questionado — e o então mais lucrativo — foi sua participação na criação da Amalgamated Copper Mining Company, um conglomerado que supostamente monopolizaria a indústria do cobre, assim como a Standard Oil, dos irmãos Rockefeller, havia monopolizado o petróleo.
Lawson elaborou o acordo junto com William Rockefeller e Henry Rogers, diretor da Standard Oil.
Em 1899, a Amalgamated Copper comprou a Anaconda Copper Company, uma próspera mineradora de cobre, através de uma operação que alguns especialistas consideram “o melhor negócio na história de Wall Street” — e um dos “menos honestos”, segundo alguns.
Os acionistas, ansiosos por participações na empresa promovida por grandes barões do mundo do business, pagaram uma fortuna pelos títulos, sem imaginar que se tratava de uma empresa fantasma (a Amalgamated Copper nem sequer tinha diretores reais, eram empregados da Standard Oil).
No final, descobriu-se que a holding havia sido criada como parte de um engenhoso plano para adquirir a Anaconda Copper Company, que acabaria sendo uma das mineradoras mais importantes do mundo durante o século 20.
A Amalgamated Copper nunca monopolizou a indústria do cobre e suas ações inflacionadas perderam o valor.
De especulador a reformista
Não contente com a má fama que havia ganhado, Lawson fez novos inimigos quando, em 1906, publicou uma série de artigos sob o título Finanças frenéticas: A história da Amalgamated, em que revelou os negócios obscuros que realizou junto com seus sócios Rockefeller e Rogers.
O material também foi publicado em formato de livro.
O multimilionário, que no início do século 20 tinha começado a sofrer grandes perdas econômicas, confessou uma série de crimes e transgressões, de suborno de membros do Legislativo a “malabarismos” com o dinheiro do povo.
Um dos capítulos do livro também denunciava “como as manipulações de Wall Street afetam o país”.
Lawson havia se tornado um reformista. Ele publicou mais denúncias sobre os males do que chamou de “o sistema”, incluindo seu romance Sexta-feira 13, de 1907.
No entanto, nem o público que ele havia enganado nem seus pares, que o deixaram excluído, estavam interessados em ouvir suas ideias sobre como tornar o mercado financeiro mais justo.
Declínio
A excêntrica vida pessoal do magnata, que construiu um enorme complexo chamado Dreamworld (Mundo dos Sonhos) na cidade de Sciutate, além de embarcações caras, como o Thomas W. Lawson, foi dilapidando sua fortuna.
Na década de 1920, suas dívidas eram tantas que ele teve que leiloar seus bens.
Ele morreu em 1925, pobre e marginalizado.
No entanto, seu legado foi mantido. Alguns ainda destacam seu brilhantismo para os negócios (em 2007, o escritor Ken Fisher o incluiu em sua lista das “100 mentes que fizeram o mercado”).
Outros elogiam suas tentativas de reformar Wall Street, algo em que investiu muito dinheiro e esforço — e em que tinha faturado bastante dinheiro, antes de ver sua sorte mudar.
E há aqueles que, sem saber, desfrutam de outras genialidades saídas da mente prolífica deste financista, transformado em justiceiro e escritor.
Por exemplo, se você está lendo este texto na sala de estar de sua casa, sentada ou sentado no seu sofá, é possível que você deva seu conforto a Lawson, que mandou projetar um dos modelos de sofá mais populares dos EUA, que ainda leva o seu nome.
Este texto foi originalmente publicado em julho de 2019 e republicado em 13/12/2024
Getty Images via BBC
Você sofre do medo de sexta-feira 13? Pois parte da culpa é de um financista americano do século 19 chamado Thomas W. Lawson.
Embora a superstição seja muito antiga, creditam a ele o feito de ter fixado a data na consciência moderna com seu romance Sexta-feira 13, que conta a história sombria de um corretor de Wall Street que manipula o valor de ações para se vingar de seus inimigos, deixando-os na miséria.
Sexta-feira e o número 13 já eram associados ao azar por si só, segundo Steve Roud, autor do guia da editora Penguin Superstições da Grã-Bretanha e Irlanda.
“Porque sexta-feira foi o dia da crucificação (de Jesus Cristo), as sextas-feiras sempre foram vistas como um dia de penitência e abstinência”, diz ele.
“A crença religiosa virou uma aversão generalizada a começar algo ou fazer qualquer coisa importante em uma sexta-feira.”
Por volta de 1690, começou a circular uma lenda urbana dizendo que ter 13 pessoas em um grupo ou em torno de uma mesa dava azar, explica Roud.
As teorias por trás da associação de azar com o número 13 incluem o número de pessoas presentes na Última Ceia e o número de bruxas em um clã.
Até que esses dois elementos, a sexta-feira e o número 13, que já causavam receio isoladamente, acabaram se unindo — justamente com o livro de Thomas W. Lawson.
Mas a associação da data com Lawson não para por aí. Diz a lenda que alguns meses depois de publicar seu romance, mais precisamente na sexta-feira 13 de dezembro de 1907, um enorme barco que ele havia mandado construir e que levava o seu nome afundou.
O naufrágio aconteceu, na verdade, nas primeiras horas do sábado, dia 14, mas em Boston, onde Lawson vivia, ainda era sexta-feira 13.
O navio era o maior veleiro já construído sem uma máquina de propulsão. Ele transportava cerca de 60 mil barris de óleo leve quando afundou e o vazamento que causou é considerado o primeiro grande desastre ecológico do tipo.
A ligação de Lawson com a sexta-feira 13 foi apenas um dos motivos que o tornaram inesquecível. Outro é que ele nasceu e morreu na pobreza, depois de ter sido, no meio do caminho, um dos homens mais ricos dos Estados Unidos.
Manipulador financeiro
Lawson nasceu em 1857 em Charlestown, Massachusetts e, quando criança, perdeu o pai, um veterano da Guerra Civil que morreu em decorrência de ferimentos que havia sofrido.
Aos 12 anos, ele se viu forçado a trabalhar e conquistou uma vaga como mensageiro em um banco em Boston. Lá, começou a nutrir a ambição de se tornar rico.
Ainda muito jovem, ele se especializou na compra e venda de ações, e historiadores contam que ele tinha um talento excepcional para escolher os títulos que mais se valorizariam.
Mas sua fortuna seria construída de maneira questionável: usando seus conhecimentos para manipular os mercados financeiros.
Lawson se especializou em mineração, especialmente no mercado de cobre, já que Boston era o centro financeiro dessa indústria.
O boom do cobre no final do século 19 o ajudou a se tornar multimilionário.
Mas enquanto ele ficava rico, muitos dos clientes a quem assessorava perdiam enormes somas de dinheiro, o que fez dele um dos mais controversos “barões ladrões” da chamada Era Dourada.
‘Amalgamated Copper Company’
Um de seus primeiros fiascos foi a orientação de investir nas minas de ferro de Grand Rivers, em Kentucky, que acabaram sendo um fracasso.
Mas seu negócio mais questionado — e o então mais lucrativo — foi sua participação na criação da Amalgamated Copper Mining Company, um conglomerado que supostamente monopolizaria a indústria do cobre, assim como a Standard Oil, dos irmãos Rockefeller, havia monopolizado o petróleo.
Lawson elaborou o acordo junto com William Rockefeller e Henry Rogers, diretor da Standard Oil.
Em 1899, a Amalgamated Copper comprou a Anaconda Copper Company, uma próspera mineradora de cobre, através de uma operação que alguns especialistas consideram “o melhor negócio na história de Wall Street” — e um dos “menos honestos”, segundo alguns.
Os acionistas, ansiosos por participações na empresa promovida por grandes barões do mundo do business, pagaram uma fortuna pelos títulos, sem imaginar que se tratava de uma empresa fantasma (a Amalgamated Copper nem sequer tinha diretores reais, eram empregados da Standard Oil).
No final, descobriu-se que a holding havia sido criada como parte de um engenhoso plano para adquirir a Anaconda Copper Company, que acabaria sendo uma das mineradoras mais importantes do mundo durante o século 20.
A Amalgamated Copper nunca monopolizou a indústria do cobre e suas ações inflacionadas perderam o valor.
De especulador a reformista
Não contente com a má fama que havia ganhado, Lawson fez novos inimigos quando, em 1906, publicou uma série de artigos sob o título Finanças frenéticas: A história da Amalgamated, em que revelou os negócios obscuros que realizou junto com seus sócios Rockefeller e Rogers.
O material também foi publicado em formato de livro.
O multimilionário, que no início do século 20 tinha começado a sofrer grandes perdas econômicas, confessou uma série de crimes e transgressões, de suborno de membros do Legislativo a “malabarismos” com o dinheiro do povo.
Um dos capítulos do livro também denunciava “como as manipulações de Wall Street afetam o país”.
Lawson havia se tornado um reformista. Ele publicou mais denúncias sobre os males do que chamou de “o sistema”, incluindo seu romance Sexta-feira 13, de 1907.
No entanto, nem o público que ele havia enganado nem seus pares, que o deixaram excluído, estavam interessados em ouvir suas ideias sobre como tornar o mercado financeiro mais justo.
Declínio
A excêntrica vida pessoal do magnata, que construiu um enorme complexo chamado Dreamworld (Mundo dos Sonhos) na cidade de Sciutate, além de embarcações caras, como o Thomas W. Lawson, foi dilapidando sua fortuna.
Na década de 1920, suas dívidas eram tantas que ele teve que leiloar seus bens.
Ele morreu em 1925, pobre e marginalizado.
No entanto, seu legado foi mantido. Alguns ainda destacam seu brilhantismo para os negócios (em 2007, o escritor Ken Fisher o incluiu em sua lista das “100 mentes que fizeram o mercado”).
Outros elogiam suas tentativas de reformar Wall Street, algo em que investiu muito dinheiro e esforço — e em que tinha faturado bastante dinheiro, antes de ver sua sorte mudar.
E há aqueles que, sem saber, desfrutam de outras genialidades saídas da mente prolífica deste financista, transformado em justiceiro e escritor.
Por exemplo, se você está lendo este texto na sala de estar de sua casa, sentada ou sentado no seu sofá, é possível que você deva seu conforto a Lawson, que mandou projetar um dos modelos de sofá mais populares dos EUA, que ainda leva o seu nome.
Este texto foi originalmente publicado em julho de 2019 e republicado em 13/12/2024
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