As redes sociais de hoje em dia não foram a primeira revolução das comunicações dominada pelos gatos. As redes sociais de hoje em dia não foram a primeira revolução das comunicações dominada pelos gatos
Coleção de Ann Lewis e Myron Sponder
Uma lei fundamental da história da comunicação afirma que, sempre que surge uma nova tecnologia, as pessoas a utilizam para fazer imagens de gatos.
E estas imagens de gatos não refletem apenas o relacionamento especial entre os seres humanos e seus animais de estimação. Elas também registram a mudança das formas de relacionamento dos seres humanos entre si.
Os memes de gatos, na sua forma moderna, datam dos anos 1990, quando o surgimento do e-mail permitiu, pela primeira vez, que amigos e profissionais entediados trocassem imagens de felinos engraçados.
Dali, o desenvolvimento da internet fez com que os gatos pulassem para as redes sociais. Vídeos como o Gato no Teclado e memes como Grumpy Cat viralizaram em diversas plataformas.
Morre Grumpy Cat, gata ‘rabugenta’ que se tornou uma lenda da internet
Reprodução/Facebook
A demanda por este tipo de conteúdo aumentou tanto que surgiram websites inteiramente dedicados a exibir as melhores imagens dos gatos eletrônicos, reunindo vídeos populares e memes dos felinos. É o caso do site ICanHasCheezburger, por exemplo.
Mas outra tendência já existia muito antes que os gatos manifestassem o desejo de comer x-búrguer. Era um tempo em que nenhum tutor poderia imaginar que seria possível usar um retângulo eletrônico para fazer um vídeo do seu pet.
Estamos falando dos cartões-postais da primeira década do século 20.
Estudiosos da história da comunicação afirmam que conhecer os cartões-postais de gatos do início do século passado pode nos ajudar a compreender as redes sociais de hoje em dia.
“Algumas coisas persistem ao longo das gerações e nas comunicações, e as imagens de gatos são uma delas. É meio que reconfortante”, afirma Ben Weiss, curador sênior do Museu de Belas Artes de Boston, nos Estados Unidos, e um dos curadores da exibição “A Era do Cartão-Postal”, promovida pela entidade.
Weiss explica que, no século 19 e no início do século 20, “os cartões-postais funcionavam como as redes sociais de hoje em dia”. Mais baratos, rápidos e convenientes do que as cartas, os cartões-postais serviam para compartilhar meditações diversas, planejar a logística dos locais e horários de encontros, contar piadas e, é claro, enviar imagens de gatos.
Selados ou enviados pelo correio em 1924 ou em postagens na ponta dos dedos em 2024, gatos de todos os tipos já se apresentaram para os artistas e para o público.
Os primeiros cartões-postais do mundo foram impressos no Império Austro-Húngaro em 1869 – uma época de surpreendentes inovações no campo dos correios.
Em 1874, 21 países fundaram a União Postal Universal, que permitiu o envio e entrega internacional de cartas. Outros países seguiram a tendência nos anos seguintes e os cartões-postais aproveitaram a ocasião.
Como ocorre hoje com os memes, os cartões-postais não transmitiam apenas uma imagem e algumas linhas de texto. Eles eram a prova concreta de uma vasta rede de poderosas instituições que os transportavam rapidamente por longas distâncias.
Eles marcaram aquele mundo em transformação e os extraordinários avanços da tecnologia, sendo enviados diariamente para as mãos e as caixas de correio dos cidadãos.
“Nós esquecemos a densidade daquela rede de comunicação do início do século 20, que movimentava os cartões-postais”, diz Weiss. “Você podia mandar um cartão-postal para alguém às 10 horas da manhã, de Manhattan para Jersey City [Estados Unidos], dizendo que chegaria às 17h30, e a mensagem era entregue com razoável rapidez.”
Os cartões-postais do início do século 20 certamente marcaram o primeiro momento da história em que a comunicação àquela velocidade era econômica e amplamente acessível para o cidadão médio.
Entre 1900 e 1914, segundo Weiss, “houve essa mania mundial do cartão-postal em massa, chegando ao ponto em que as pessoas o descreviam como sendo uma doença na corrente sanguínea do público”.
Na época da mania dos cartões-postais, circularam milhões e milhões de cartões. Era o momento perfeito para que os gatos tomassem conta do novo meio de comunicação.
Pessoas da alta sociedade e membros da realeza, como a própria rainha Vitória, eram famosos apreciadores de gatos. E já havia se estabelecido a associação do animal com o Dia das Bruxas.
Alguns cartões-postais mostravam gatos simplesmente sendo gatos: bebendo leite dos seus pires, brincando com fios ou relaxando ao sol. Outros apareciam vestidos como seres humanos, trabalhando e participando das cenas domésticas.
Mas nem todos aceitavam bem a influência dos cartões-postais na sociedade.
Alarmados pela popularidade do produto, os jornais chamavam os cartões de “novo terror” e “monstro de Frankenstein”, segundo Monica Cure, autora do livro Picturing the Postcard: A New Media Crisis at the Turn of the Century (“Retratando o cartão-postal: uma nova crise de comunicação na virada do século”, em tradução livre).
Na época, as sacolas dos carteiros ficavam abarrotadas de cartões-postais, gerando histórias de ferimentos causados ao erguer as pesadas malas postais.
“Os cartões-postais eram considerados rápidos demais”, conta Cure.
“Havia muitas reclamações sobre as consequências dos cartões-postais para as capacidades de leitura e escrita das pessoas, pois, se você pudesse apenas rabiscar algumas linhas, por que precisaria aprender gramática e escrever bem?”
As pessoas também receavam que o cartão-postal pudesse gerar relacionamentos mais superficiais. Afinal, em vez de trocarem páginas de cartas, as pessoas simplesmente enviavam fotografias umas às outras.
A natureza pública e aberta dos cartões-postais também era assustadora para muitas pessoas, segundo Cure. A primeira proposta de cartão-postal, na verdade, foi rejeitada porque “era assustador demais ter algo em que os empregados pudessem ler suas mensagens”.
Atualmente, existem receios similares nas discussões sobre as redes sociais. Elas são rápidas demais, ameaçam a segurança nacional e geram pensamentos menos profundos.
Cure relembra que as novas tecnologias de comunicação alteram a maneira em que as pessoas costumam ver a si próprias e às suas comunidades. E, é claro, as novas formas de redes sociais também trazem novas formas de gatos.
Os gatos e o voto feminino
Como nos memes de hoje em dia, a cultura dos cartões-postais se entrecruzava com a política. E alguns dos mais famosos cartões-postais de gatos eram associados ao movimento sufragista – que defendia o voto das mulheres.
Os cartões-postais eram vendidos para levantar fundos para causas sociais, mas as empresas produtoras também aproveitavam qualquer oportunidade de produzir conteúdo relativo a questões que preocupassem as pessoas.
“Os cartões-postais se parecem com memes e, da mesma forma que ocorre atualmente, a cultura visual do início do século 20 era relacionada a animais, especialmente gatos”, conta a bibliotecária Heidi Herr, da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos. Ela é curadora da exibição “Votos e Anáguas”, dedicada à cultura visual do movimento sufragista.
Os gatos eram tipicamente associados ao ambiente doméstico e “deveriam ser passivos, bonitos, decorativos e modestos”, segundo Herr. Mas os gatos também são predadores e qualquer tutor pode confirmar como os felinos gostam de usar as suas garras.
“As sufragistas eram rainhas do capitalismo, elas construíram sua marca”, conta Herr.
O movimento usou inteligentemente as novas formas de comunicação, como os cartões-postais e o cinema, para difundir suas mensagens. E os gatos ofereciam forte simbolismo.
Ann Lewis é colecionadora de recordações do movimento sufragista e foi diretora de comunicação da Casa Branca, durante o mandato do ex-presidente americano Bill Clinton. Ela conta que ficou “imensamente impressionada” com as mensagens políticas do movimento sufragista.
“A política é questão de comunicação”, afirma Lewis, “[de] dizer às pessoas por que elas devem votar em você.”
Em uma era em que a comunicação de massa era essencialmente restrita aos jornais e ao correio, as sufragistas passaram décadas defendendo com sucesso uma campanha de convencimento de um eleitorado totalmente masculino – e a nova forma de comunicação foi parte fundamental do seu sucesso.
“Os cartões-postais foram o e-mail da sua época, baratos e pessoais”, destaca Lewis.
Os cartões-postais de gatos das sufragistas ainda inspiram a geração atual, que foi criada com memes de gatos. Herr destaca que os adesivos produzidos pela biblioteca com os gatos das sufragistas estão entre os itens mais procurados no campus da Johns Hopkins.
“Já vejo alunos com esses adesivos em garrafas de água e laptops”, ela conta. “Nós distribuímos reproduções que podem ser vistas nas janelas dos dormitórios. As pessoas adoram os gatos.”
De fato, as pessoas adoram os gatos, mas elas também gostam muito umas das outras.
Seja em um meme na internet ou em um cartão-postal, a história das comunicações demonstra que poucas coisas despertam mais o interesse das pessoas do que compartilhar imagens de animais fofos e engraçados.
Coleção de Ann Lewis e Myron Sponder
Uma lei fundamental da história da comunicação afirma que, sempre que surge uma nova tecnologia, as pessoas a utilizam para fazer imagens de gatos.
E estas imagens de gatos não refletem apenas o relacionamento especial entre os seres humanos e seus animais de estimação. Elas também registram a mudança das formas de relacionamento dos seres humanos entre si.
Os memes de gatos, na sua forma moderna, datam dos anos 1990, quando o surgimento do e-mail permitiu, pela primeira vez, que amigos e profissionais entediados trocassem imagens de felinos engraçados.
Dali, o desenvolvimento da internet fez com que os gatos pulassem para as redes sociais. Vídeos como o Gato no Teclado e memes como Grumpy Cat viralizaram em diversas plataformas.
Morre Grumpy Cat, gata ‘rabugenta’ que se tornou uma lenda da internet
Reprodução/Facebook
A demanda por este tipo de conteúdo aumentou tanto que surgiram websites inteiramente dedicados a exibir as melhores imagens dos gatos eletrônicos, reunindo vídeos populares e memes dos felinos. É o caso do site ICanHasCheezburger, por exemplo.
Mas outra tendência já existia muito antes que os gatos manifestassem o desejo de comer x-búrguer. Era um tempo em que nenhum tutor poderia imaginar que seria possível usar um retângulo eletrônico para fazer um vídeo do seu pet.
Estamos falando dos cartões-postais da primeira década do século 20.
Estudiosos da história da comunicação afirmam que conhecer os cartões-postais de gatos do início do século passado pode nos ajudar a compreender as redes sociais de hoje em dia.
“Algumas coisas persistem ao longo das gerações e nas comunicações, e as imagens de gatos são uma delas. É meio que reconfortante”, afirma Ben Weiss, curador sênior do Museu de Belas Artes de Boston, nos Estados Unidos, e um dos curadores da exibição “A Era do Cartão-Postal”, promovida pela entidade.
Weiss explica que, no século 19 e no início do século 20, “os cartões-postais funcionavam como as redes sociais de hoje em dia”. Mais baratos, rápidos e convenientes do que as cartas, os cartões-postais serviam para compartilhar meditações diversas, planejar a logística dos locais e horários de encontros, contar piadas e, é claro, enviar imagens de gatos.
Selados ou enviados pelo correio em 1924 ou em postagens na ponta dos dedos em 2024, gatos de todos os tipos já se apresentaram para os artistas e para o público.
Os primeiros cartões-postais do mundo foram impressos no Império Austro-Húngaro em 1869 – uma época de surpreendentes inovações no campo dos correios.
Em 1874, 21 países fundaram a União Postal Universal, que permitiu o envio e entrega internacional de cartas. Outros países seguiram a tendência nos anos seguintes e os cartões-postais aproveitaram a ocasião.
Como ocorre hoje com os memes, os cartões-postais não transmitiam apenas uma imagem e algumas linhas de texto. Eles eram a prova concreta de uma vasta rede de poderosas instituições que os transportavam rapidamente por longas distâncias.
Eles marcaram aquele mundo em transformação e os extraordinários avanços da tecnologia, sendo enviados diariamente para as mãos e as caixas de correio dos cidadãos.
“Nós esquecemos a densidade daquela rede de comunicação do início do século 20, que movimentava os cartões-postais”, diz Weiss. “Você podia mandar um cartão-postal para alguém às 10 horas da manhã, de Manhattan para Jersey City [Estados Unidos], dizendo que chegaria às 17h30, e a mensagem era entregue com razoável rapidez.”
Os cartões-postais do início do século 20 certamente marcaram o primeiro momento da história em que a comunicação àquela velocidade era econômica e amplamente acessível para o cidadão médio.
Entre 1900 e 1914, segundo Weiss, “houve essa mania mundial do cartão-postal em massa, chegando ao ponto em que as pessoas o descreviam como sendo uma doença na corrente sanguínea do público”.
Na época da mania dos cartões-postais, circularam milhões e milhões de cartões. Era o momento perfeito para que os gatos tomassem conta do novo meio de comunicação.
Pessoas da alta sociedade e membros da realeza, como a própria rainha Vitória, eram famosos apreciadores de gatos. E já havia se estabelecido a associação do animal com o Dia das Bruxas.
Alguns cartões-postais mostravam gatos simplesmente sendo gatos: bebendo leite dos seus pires, brincando com fios ou relaxando ao sol. Outros apareciam vestidos como seres humanos, trabalhando e participando das cenas domésticas.
Mas nem todos aceitavam bem a influência dos cartões-postais na sociedade.
Alarmados pela popularidade do produto, os jornais chamavam os cartões de “novo terror” e “monstro de Frankenstein”, segundo Monica Cure, autora do livro Picturing the Postcard: A New Media Crisis at the Turn of the Century (“Retratando o cartão-postal: uma nova crise de comunicação na virada do século”, em tradução livre).
Na época, as sacolas dos carteiros ficavam abarrotadas de cartões-postais, gerando histórias de ferimentos causados ao erguer as pesadas malas postais.
“Os cartões-postais eram considerados rápidos demais”, conta Cure.
“Havia muitas reclamações sobre as consequências dos cartões-postais para as capacidades de leitura e escrita das pessoas, pois, se você pudesse apenas rabiscar algumas linhas, por que precisaria aprender gramática e escrever bem?”
As pessoas também receavam que o cartão-postal pudesse gerar relacionamentos mais superficiais. Afinal, em vez de trocarem páginas de cartas, as pessoas simplesmente enviavam fotografias umas às outras.
A natureza pública e aberta dos cartões-postais também era assustadora para muitas pessoas, segundo Cure. A primeira proposta de cartão-postal, na verdade, foi rejeitada porque “era assustador demais ter algo em que os empregados pudessem ler suas mensagens”.
Atualmente, existem receios similares nas discussões sobre as redes sociais. Elas são rápidas demais, ameaçam a segurança nacional e geram pensamentos menos profundos.
Cure relembra que as novas tecnologias de comunicação alteram a maneira em que as pessoas costumam ver a si próprias e às suas comunidades. E, é claro, as novas formas de redes sociais também trazem novas formas de gatos.
Os gatos e o voto feminino
Como nos memes de hoje em dia, a cultura dos cartões-postais se entrecruzava com a política. E alguns dos mais famosos cartões-postais de gatos eram associados ao movimento sufragista – que defendia o voto das mulheres.
Os cartões-postais eram vendidos para levantar fundos para causas sociais, mas as empresas produtoras também aproveitavam qualquer oportunidade de produzir conteúdo relativo a questões que preocupassem as pessoas.
“Os cartões-postais se parecem com memes e, da mesma forma que ocorre atualmente, a cultura visual do início do século 20 era relacionada a animais, especialmente gatos”, conta a bibliotecária Heidi Herr, da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos. Ela é curadora da exibição “Votos e Anáguas”, dedicada à cultura visual do movimento sufragista.
Os gatos eram tipicamente associados ao ambiente doméstico e “deveriam ser passivos, bonitos, decorativos e modestos”, segundo Herr. Mas os gatos também são predadores e qualquer tutor pode confirmar como os felinos gostam de usar as suas garras.
“As sufragistas eram rainhas do capitalismo, elas construíram sua marca”, conta Herr.
O movimento usou inteligentemente as novas formas de comunicação, como os cartões-postais e o cinema, para difundir suas mensagens. E os gatos ofereciam forte simbolismo.
Ann Lewis é colecionadora de recordações do movimento sufragista e foi diretora de comunicação da Casa Branca, durante o mandato do ex-presidente americano Bill Clinton. Ela conta que ficou “imensamente impressionada” com as mensagens políticas do movimento sufragista.
“A política é questão de comunicação”, afirma Lewis, “[de] dizer às pessoas por que elas devem votar em você.”
Em uma era em que a comunicação de massa era essencialmente restrita aos jornais e ao correio, as sufragistas passaram décadas defendendo com sucesso uma campanha de convencimento de um eleitorado totalmente masculino – e a nova forma de comunicação foi parte fundamental do seu sucesso.
“Os cartões-postais foram o e-mail da sua época, baratos e pessoais”, destaca Lewis.
Os cartões-postais de gatos das sufragistas ainda inspiram a geração atual, que foi criada com memes de gatos. Herr destaca que os adesivos produzidos pela biblioteca com os gatos das sufragistas estão entre os itens mais procurados no campus da Johns Hopkins.
“Já vejo alunos com esses adesivos em garrafas de água e laptops”, ela conta. “Nós distribuímos reproduções que podem ser vistas nas janelas dos dormitórios. As pessoas adoram os gatos.”
De fato, as pessoas adoram os gatos, mas elas também gostam muito umas das outras.
Seja em um meme na internet ou em um cartão-postal, a história das comunicações demonstra que poucas coisas despertam mais o interesse das pessoas do que compartilhar imagens de animais fofos e engraçados.
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Postado em: 13:02