A renúncia à reunificação é a maior mudança ideológica da Coreia do Norte em mais de 70 anos. O que motivou essa decisão? O líder da Coreia do Norte, Kim Jong Un, durante uma cerimônia de despedida do presidente da Rússia, Vladimir Putin, no aeroporto de Pyongyang, Coreia do Norte, em 19 de junho de 2024
Sputnik/Gavriil Grigorov/Pool via REUTERS
Kim Jong-un anunciou, em 2024, a maior mudança ideológica nos 77 anos de história da Coreia do Norte.
A reunificação da península e do povo coreano, objetivo histórico do Estado comunista fundado em 1947 por seu avô Kim Il-sung, não apenas deixou de ser uma prioridade, como foi totalmente abandonada.
O líder norte-coreano proclamou que a reunificação não é mais uma meta, e que a Coreia do Sul é agora o “principal inimigo”, título que antes pertencia exclusivamente aos Estados Unidos.
E não foram apenas palavras: Kim desmantelou os organismos de diálogo e cooperação entre as Coreias, ordenou a demolição do simbólico Arco da Reunificação e a destruição de estradas e ferrovias que haviam sido projetadas para conectar os dois países quando eram um só.
O termo “reunificação”— tongil, em coreano — também foi removido de jornais, livros didáticos e até mesmo de uma estação de metrô em Pyongyang, que passou a se chamar Moranbong.
Tudo isso aconteceu em um momento de tensão entre o Norte e o Sul, mas os dois Estados têm alternado fases de conflito e reaproximação há décadas, sem ter questionado até então o objetivo sagrado da reunificação.
O que está por trás, afinal, da mudança radical de paradigma de Kim?
A importância da reunificação
A Península da Coreia e o povo coreano estão divididos em Norte e Sul há quase oito décadas.
Parece muito tempo, mas não é tanto se comparado aos mais de 12 séculos em que seu território permaneceu unido sob diferentes dinastias e impérios, do ano 668 até 1945.
É por isso que, quando os americanos e os soviéticos dividiram o país após a Segunda Guerra Mundial, tanto no Norte comunista quanto no Sul capitalista, a secessão foi vista como uma anomalia histórica que precisava ser corrigida o quanto antes.
Kim Il-sung, fundador da Coreia do Norte e avô do atual líder, tentou fazer isso pela força, e quase conseguiu quando invadiu o Sul em 1950.
“Kim pressionou muito [Joseph] Stalin e Mao [Tsé Tung] para permitir que ele invadisse a Coreia do Sul, até que conseguiu em 1950, com o objetivo principal de alcançar a reunificação sob seus termos, assumindo o controle do Sul”, explica à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, o acadêmico Sung-Yoon Lee, professor de estudos coreanos no Wilson Center em Washington DC.
No entanto, a Guerra da Coreia (1950-1953) deixou mais de dois milhões de mortos em ambos os lados, e a fronteira ficou praticamente no mesmo lugar em que estava no início, consolidando a divisão do país.
O armistício que encerrou o conflito nunca foi substituído por um tratado de paz — até hoje, o Norte e o Sul permanecem tecnicamente em guerra, e separados pela quase intransponível Zona Desmilitarizada (DMZ).
Desde então, dois sistemas que, de outra forma, seriam irreconciliáveis, mantiveram um ideal comum: a reunificação.
Na Coreia do Sul, o artigo 4 da Constituição de 1948, ainda em vigor, estabelece como objetivo a “reunificação nacional sob os princípios da liberdade e da democracia pacífica”.
A Coreia do Norte, por sua vez, propunha a “reunificação nacional baseada na independência, a unificação pacífica e a grande unidade nacional”, de acordo com o artigo 9 da sua Constituição, que também menciona “a vitória do socialismo” como objetivo prévio.
Reunificação pacífica ou pela força?
Mas como unir novamente o país e o povo coreano? É neste ponto que os dois Estados divergem, uma vez que aspiram fazer isso sob seus próprios termos.
Na Coreia do Sul — que tem mais do que o dobro da população da Coreia do Norte, e um Produto interno bruto (PIB) quase 60 vezes maior, de acordo com dados de 2023 —, a opção que ganhou mais força nas últimas décadas foi o modelo alemão: absorver o vizinho sob um sistema democrático de livre mercado.
Pyongyang, por sua vez, tem aspirado tradicionalmente impor o socialismo em toda a península, embora, desde a década de 1980, também tenha cogitado a ideia de um único Estado de confederação com dois sistemas, no estilo da China e de Hong Kong.
A reunificação pacífica com a coexistência de dois sistemas foi, de fato, o objetivo declarado da histórica declaração conjunta assinada em junho de 2000 pelo então líder norte-coreano Kim Jong-il (pai de Kim Jong-un) e pelo sul-coreano Kim Dae-jung, mas que, ao longo dos anos, permaneceu letra morta.
“A unificação pela força, não importa quantas vidas sejam perdidas, sempre foi a missão nacional suprema do regime Kim, de Kim Il-sung a Kim Jong-un”, observa Lee.
O acadêmico do Wilson Center acredita que, no fundo, “a metodologia prioritária de Pyongyang sempre foi o ‘modelo do Vietnã’, ou seja, forçar os EUA a abandonar parcialmente o Sul por meio de uma combinação de força e diplomacia”.
Kim Jong-un pediu que a Constituição da Coreia do Norte fosse alterada para remover as referências à reunificação e definir a Coreia do Sul como um “Estado hostil”.
Isso, junto às medidas mencionadas anteriormente, como a dissolução de organismos de cooperação e a demolição de monumentos e estradas, marca uma mudança ideológica surpreendente no país comunista — e levanta questionamentos sobre o que o líder norte-coreano realmente está buscando.
A seguir, analisamos as diferentes hipóteses que tentam responder a esta pergunta.
Em imagem de arquivo, soldados da Coreia do Norte marcham durante parada em Pyongyang.
Coreia do Norte via AP
Os motivos de Kim
Kim atribuiu sua mudança ideológica às “provocações” da Coreia do Sul e dos EUA, como fortalecer a cooperação com o Japão, criar um grupo para coordenar respostas a um ataque nuclear e expandir o comando da ONU.
No entanto, nas últimas décadas, foram observados episódios frequentes e ainda mais graves de tensão na Península da Coreia, sem que o Norte considerasse abandonar o ideal de reunificação.
Por que ele fez isso agora, então? Para Ellen Kim, pesquisadora do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIC, na sigla em inglês), com sede em Washington DC, “o regime norte-coreano não quer mais a reunificação, sobretudo para preservar seu próprio sistema”.
“Eles temem a popularidade dos filmes, das músicas e das séries de TV sul-coreanas entre a geração mais jovem do Norte”, afirmou ela à BBC News Mundo.
A pesquisadora explica que, “à medida que pessoas de fora enviam mais informação à Coreia do Norte, a crescente conscientização da população em relação à prosperidade econômica da Coreia do Sul e do resto do mundo pode lançar dúvidas sobre a liderança de Kim Jong-un”.
“Assim, a forma mais eficaz de o regime fazer com que os norte-coreanos se voltem contra a Coreia do Sul é apontá-la como o principal inimigo”, afirma.
Em termos semelhantes, Christopher Green, consultor especializado na península coreana do think tank International Crisis Group (ICG), acredita que Kim Jong-un está tentando restringir “a crescente influência cultural e política da Coreia do Sul” sobre a população do Norte.
“Nos últimos 30 anos, a cultura pop sul-coreana (especialmente o K-pop, as novelas e os filmes) irrompeu na Coreia do Norte, desafiando o controle do regime sobre a informação. Pyongyang tentou impedir o fluxo deste conteúdo por meio de suas fronteiras, mas com sucesso limitado”, escreveu ele em uma coluna publicada no site do ICG.
O especialista enfatiza que, depois de endurecer as punições por vender ou consumir conteúdo estrangeiro desde 2020, “a nova virada de Kim é o reflexo institucional de uma tendência que vem se desenvolvendo há vários anos”, com o objetivo de “preservar a narrativa legitimadora do regime e manter o controle ideológico”.
Outros especialistas acreditam que o principal objetivo do líder norte-coreano é eliminar qualquer possibilidade de que o modelo alemão, mencionado anteriormente, seja aplicado à península.
“É natural que a Coreia do Norte, que sofre de crises econômicas crônicas e sistêmicas , esteja preocupada com uma possível unificação mediante absorção. Portanto, sua melhor estratégia de sobrevivência seria uma ruptura política e jurídica completa com a Coreia do Sul”, argumenta o acadêmico Bong-geun Jun, consultor sobre o Nordeste Asiático do Instituto de Paz dos Estados Unidos, em uma análise publicada em seu site.
Pura estratégia?
Outros analistas acreditam que tudo não passa de uma mera estratégia política de Kim Jong-un que, no fundo, não está renunciando às suas ambições de unificar a península. Claro, sob seu mandato.
“Podemos especificar em nossa Constituição a questão de ocupar, subjugar e reivindicar completamente a República da Coreia (do Sul) e anexá-la como parte do território da nossa república no caso de estourar uma guerra na península da Coreia”, disse o líder norte-coreano em janeiro.
Para o professor Sung-Yoon Lee, trata-se de “uma guerra política”, na qual Kim está tentando criar instabilidade no país “inimigo”.
O regime norte-coreano “destaca-se não só nas provocações calculadas contra os EUA e a Coreia do Sul, e na lavagem cerebral da sua população, como também na manipulação psicológica do povo sul-coreano”, avalia o acadêmico, que observa que “a ideia de abandonar a reunificação pacífica gera tensão política e social no Sul”.
“Não há razão para acreditar que Kim Jong-un tenha desistido em algum momento de tomar o território sul-coreano e seu povo pela força”, resume Lee.
O especialista também acredita que, ao considerar o Estado sul-coreano como um “inimigo”, o líder comunista está em uma posição mais confortável para justificar ações hostis, “desde lançar balões carregados de fezes no Sul até enviar tropas de combate para a Rússia para lutar contra a Ucrânia, ameaçando constantemente ‘aniquilar’ a Coreia do Sul”.
Um momento-chave
De qualquer forma, a mudança ideológica de Kim acontece em um momento crucial na cena regional e internacional.
A Coreia do Norte e a Rússia protagonizaram sua maior aproximação desde a Guerra Fria, com Pyongyang fornecendo armas — desafiando as sanções internacionais que Moscou também havia aprovado na época — e, finalmente, mobilizando suas tropas para o conflito na Ucrânia.
A isso se soma a incerteza diante da mudança de governo em Washington após a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais em novembro, que em seu mandato anterior se tornou o primeiro presidente dos EUA a se reunir com um líder norte-coreano.
O regime de Kim Jong-un continuou, por sua vez, a reforçar sua tecnologia e arsenal militar nos últimos anos, com mísseis e ogivas nucleares cada vez mais numerosos, potentes e sofisticados.
Tudo isso, de acordo com especialistas, faz parte da estratégia do líder de fortalecer sua posição no cenário internacional, buscando aliados estratégicos que permitam a ele combater a pressão ocidental e projetar sua influência além da Península da Coreia.
Sputnik/Gavriil Grigorov/Pool via REUTERS
Kim Jong-un anunciou, em 2024, a maior mudança ideológica nos 77 anos de história da Coreia do Norte.
A reunificação da península e do povo coreano, objetivo histórico do Estado comunista fundado em 1947 por seu avô Kim Il-sung, não apenas deixou de ser uma prioridade, como foi totalmente abandonada.
O líder norte-coreano proclamou que a reunificação não é mais uma meta, e que a Coreia do Sul é agora o “principal inimigo”, título que antes pertencia exclusivamente aos Estados Unidos.
E não foram apenas palavras: Kim desmantelou os organismos de diálogo e cooperação entre as Coreias, ordenou a demolição do simbólico Arco da Reunificação e a destruição de estradas e ferrovias que haviam sido projetadas para conectar os dois países quando eram um só.
O termo “reunificação”— tongil, em coreano — também foi removido de jornais, livros didáticos e até mesmo de uma estação de metrô em Pyongyang, que passou a se chamar Moranbong.
Tudo isso aconteceu em um momento de tensão entre o Norte e o Sul, mas os dois Estados têm alternado fases de conflito e reaproximação há décadas, sem ter questionado até então o objetivo sagrado da reunificação.
O que está por trás, afinal, da mudança radical de paradigma de Kim?
A importância da reunificação
A Península da Coreia e o povo coreano estão divididos em Norte e Sul há quase oito décadas.
Parece muito tempo, mas não é tanto se comparado aos mais de 12 séculos em que seu território permaneceu unido sob diferentes dinastias e impérios, do ano 668 até 1945.
É por isso que, quando os americanos e os soviéticos dividiram o país após a Segunda Guerra Mundial, tanto no Norte comunista quanto no Sul capitalista, a secessão foi vista como uma anomalia histórica que precisava ser corrigida o quanto antes.
Kim Il-sung, fundador da Coreia do Norte e avô do atual líder, tentou fazer isso pela força, e quase conseguiu quando invadiu o Sul em 1950.
“Kim pressionou muito [Joseph] Stalin e Mao [Tsé Tung] para permitir que ele invadisse a Coreia do Sul, até que conseguiu em 1950, com o objetivo principal de alcançar a reunificação sob seus termos, assumindo o controle do Sul”, explica à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, o acadêmico Sung-Yoon Lee, professor de estudos coreanos no Wilson Center em Washington DC.
No entanto, a Guerra da Coreia (1950-1953) deixou mais de dois milhões de mortos em ambos os lados, e a fronteira ficou praticamente no mesmo lugar em que estava no início, consolidando a divisão do país.
O armistício que encerrou o conflito nunca foi substituído por um tratado de paz — até hoje, o Norte e o Sul permanecem tecnicamente em guerra, e separados pela quase intransponível Zona Desmilitarizada (DMZ).
Desde então, dois sistemas que, de outra forma, seriam irreconciliáveis, mantiveram um ideal comum: a reunificação.
Na Coreia do Sul, o artigo 4 da Constituição de 1948, ainda em vigor, estabelece como objetivo a “reunificação nacional sob os princípios da liberdade e da democracia pacífica”.
A Coreia do Norte, por sua vez, propunha a “reunificação nacional baseada na independência, a unificação pacífica e a grande unidade nacional”, de acordo com o artigo 9 da sua Constituição, que também menciona “a vitória do socialismo” como objetivo prévio.
Reunificação pacífica ou pela força?
Mas como unir novamente o país e o povo coreano? É neste ponto que os dois Estados divergem, uma vez que aspiram fazer isso sob seus próprios termos.
Na Coreia do Sul — que tem mais do que o dobro da população da Coreia do Norte, e um Produto interno bruto (PIB) quase 60 vezes maior, de acordo com dados de 2023 —, a opção que ganhou mais força nas últimas décadas foi o modelo alemão: absorver o vizinho sob um sistema democrático de livre mercado.
Pyongyang, por sua vez, tem aspirado tradicionalmente impor o socialismo em toda a península, embora, desde a década de 1980, também tenha cogitado a ideia de um único Estado de confederação com dois sistemas, no estilo da China e de Hong Kong.
A reunificação pacífica com a coexistência de dois sistemas foi, de fato, o objetivo declarado da histórica declaração conjunta assinada em junho de 2000 pelo então líder norte-coreano Kim Jong-il (pai de Kim Jong-un) e pelo sul-coreano Kim Dae-jung, mas que, ao longo dos anos, permaneceu letra morta.
“A unificação pela força, não importa quantas vidas sejam perdidas, sempre foi a missão nacional suprema do regime Kim, de Kim Il-sung a Kim Jong-un”, observa Lee.
O acadêmico do Wilson Center acredita que, no fundo, “a metodologia prioritária de Pyongyang sempre foi o ‘modelo do Vietnã’, ou seja, forçar os EUA a abandonar parcialmente o Sul por meio de uma combinação de força e diplomacia”.
Kim Jong-un pediu que a Constituição da Coreia do Norte fosse alterada para remover as referências à reunificação e definir a Coreia do Sul como um “Estado hostil”.
Isso, junto às medidas mencionadas anteriormente, como a dissolução de organismos de cooperação e a demolição de monumentos e estradas, marca uma mudança ideológica surpreendente no país comunista — e levanta questionamentos sobre o que o líder norte-coreano realmente está buscando.
A seguir, analisamos as diferentes hipóteses que tentam responder a esta pergunta.
Em imagem de arquivo, soldados da Coreia do Norte marcham durante parada em Pyongyang.
Coreia do Norte via AP
Os motivos de Kim
Kim atribuiu sua mudança ideológica às “provocações” da Coreia do Sul e dos EUA, como fortalecer a cooperação com o Japão, criar um grupo para coordenar respostas a um ataque nuclear e expandir o comando da ONU.
No entanto, nas últimas décadas, foram observados episódios frequentes e ainda mais graves de tensão na Península da Coreia, sem que o Norte considerasse abandonar o ideal de reunificação.
Por que ele fez isso agora, então? Para Ellen Kim, pesquisadora do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIC, na sigla em inglês), com sede em Washington DC, “o regime norte-coreano não quer mais a reunificação, sobretudo para preservar seu próprio sistema”.
“Eles temem a popularidade dos filmes, das músicas e das séries de TV sul-coreanas entre a geração mais jovem do Norte”, afirmou ela à BBC News Mundo.
A pesquisadora explica que, “à medida que pessoas de fora enviam mais informação à Coreia do Norte, a crescente conscientização da população em relação à prosperidade econômica da Coreia do Sul e do resto do mundo pode lançar dúvidas sobre a liderança de Kim Jong-un”.
“Assim, a forma mais eficaz de o regime fazer com que os norte-coreanos se voltem contra a Coreia do Sul é apontá-la como o principal inimigo”, afirma.
Em termos semelhantes, Christopher Green, consultor especializado na península coreana do think tank International Crisis Group (ICG), acredita que Kim Jong-un está tentando restringir “a crescente influência cultural e política da Coreia do Sul” sobre a população do Norte.
“Nos últimos 30 anos, a cultura pop sul-coreana (especialmente o K-pop, as novelas e os filmes) irrompeu na Coreia do Norte, desafiando o controle do regime sobre a informação. Pyongyang tentou impedir o fluxo deste conteúdo por meio de suas fronteiras, mas com sucesso limitado”, escreveu ele em uma coluna publicada no site do ICG.
O especialista enfatiza que, depois de endurecer as punições por vender ou consumir conteúdo estrangeiro desde 2020, “a nova virada de Kim é o reflexo institucional de uma tendência que vem se desenvolvendo há vários anos”, com o objetivo de “preservar a narrativa legitimadora do regime e manter o controle ideológico”.
Outros especialistas acreditam que o principal objetivo do líder norte-coreano é eliminar qualquer possibilidade de que o modelo alemão, mencionado anteriormente, seja aplicado à península.
“É natural que a Coreia do Norte, que sofre de crises econômicas crônicas e sistêmicas , esteja preocupada com uma possível unificação mediante absorção. Portanto, sua melhor estratégia de sobrevivência seria uma ruptura política e jurídica completa com a Coreia do Sul”, argumenta o acadêmico Bong-geun Jun, consultor sobre o Nordeste Asiático do Instituto de Paz dos Estados Unidos, em uma análise publicada em seu site.
Pura estratégia?
Outros analistas acreditam que tudo não passa de uma mera estratégia política de Kim Jong-un que, no fundo, não está renunciando às suas ambições de unificar a península. Claro, sob seu mandato.
“Podemos especificar em nossa Constituição a questão de ocupar, subjugar e reivindicar completamente a República da Coreia (do Sul) e anexá-la como parte do território da nossa república no caso de estourar uma guerra na península da Coreia”, disse o líder norte-coreano em janeiro.
Para o professor Sung-Yoon Lee, trata-se de “uma guerra política”, na qual Kim está tentando criar instabilidade no país “inimigo”.
O regime norte-coreano “destaca-se não só nas provocações calculadas contra os EUA e a Coreia do Sul, e na lavagem cerebral da sua população, como também na manipulação psicológica do povo sul-coreano”, avalia o acadêmico, que observa que “a ideia de abandonar a reunificação pacífica gera tensão política e social no Sul”.
“Não há razão para acreditar que Kim Jong-un tenha desistido em algum momento de tomar o território sul-coreano e seu povo pela força”, resume Lee.
O especialista também acredita que, ao considerar o Estado sul-coreano como um “inimigo”, o líder comunista está em uma posição mais confortável para justificar ações hostis, “desde lançar balões carregados de fezes no Sul até enviar tropas de combate para a Rússia para lutar contra a Ucrânia, ameaçando constantemente ‘aniquilar’ a Coreia do Sul”.
Um momento-chave
De qualquer forma, a mudança ideológica de Kim acontece em um momento crucial na cena regional e internacional.
A Coreia do Norte e a Rússia protagonizaram sua maior aproximação desde a Guerra Fria, com Pyongyang fornecendo armas — desafiando as sanções internacionais que Moscou também havia aprovado na época — e, finalmente, mobilizando suas tropas para o conflito na Ucrânia.
A isso se soma a incerteza diante da mudança de governo em Washington após a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais em novembro, que em seu mandato anterior se tornou o primeiro presidente dos EUA a se reunir com um líder norte-coreano.
O regime de Kim Jong-un continuou, por sua vez, a reforçar sua tecnologia e arsenal militar nos últimos anos, com mísseis e ogivas nucleares cada vez mais numerosos, potentes e sofisticados.
Tudo isso, de acordo com especialistas, faz parte da estratégia do líder de fortalecer sua posição no cenário internacional, buscando aliados estratégicos que permitam a ele combater a pressão ocidental e projetar sua influência além da Península da Coreia.
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