Fiscalização do Ministério do Trabalho resgatou seis trabalhadores em condições de trabalho semelhantes às de escravidão, incluindo um adolescente. Cantor diz que não sabia da situação. Banheiro estragado, sem água, encontrado na Fazenda Lakanka, de Leonardo, em Goiás
Reprodução/Relatório Fotográfico da Inspeção
Em relatório produzido pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), ao qual o g1 teve acesso, os seis funcionários resgatados em condições análogas à escravidão em uma fazenda do cantor Leonardo disseram que trabalhavam 10 horas por dia, não tinham contrato e nem descanso semanal remunerado. Saiba mais detalhes ao longo desta reportagem.
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Leonardo foi incluído na “lista suja” do ministério, divulgada na segunda-feira (7), após uma fiscalização resgatar seis trabalhadores em condições análogas à escravidão na Fazenda Lakanka, em Jussara, no noroeste goiano. Entre os resgatados, havia um adolescente de 17 anos de idade.
Os seis funcionários resgatados dormiam em uma casa abandonada, localizada a 2 quilômetros da sede da Fazenda Lakanka. Segundo os fiscais, o local era “precário”, sem banheiros e com camas improvisadas. Eles também identificaram infestação de morcegos e fezes.
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ENTENDA: O que é a ‘lista suja’ do trabalho escravo que incluiu o cantor Leonardo
A fiscalização ocorreu em novembro de 2023 em duas fazendas: a Lakanka e a Talismã, que é avaliada em R$ 60 milhões. A segunda é citada porque, apesar de os trabalhadores resgatados estarem na Fazenda Lakanka, as duas ficam em área contígua e fazem parte do mesmo conjunto de operações agrícolas (veja detalhes mais abaixo).
Em nota ao g1, o Ministério Público do Trabalho confirmou que Leonardo já pagou as indenizações e o caso foi arquivado em abril deste ano. O cantor afirma que não sabia da situação até ser notificado pelas autoridades, pois a área fiscalizada está arrendada para outra pessoa.
Área arrendada
Os trabalhadores resgatados catavam raízes na Fazenda Lakanka, que está arrendada para outra pessoa. O arrendamento ocorre quando o proprietário de uma área – no caso Leonardo – cede o local para uso por meio do pagamento de um valor acordado.
O documento descreve que o cantor tinha como obrigação contratual entregar uma parte da Fazenda Lakanka pronta para o plantio, garantindo que o solo estivesse limpo e preparado. Já o arrendatário, segundo o documento, era responsável por executar o plantio e o manejo das atividades agrícolas uma vez que a área estivesse adequada para isso.
Por isso, embora o arrendatário tivesse responsabilidades sobre o plantio, as etapas de preparação do solo, como a catação de raízes e plantação de grama, ainda era de responsabilidade de Leonardo, tanto em termos de execução quanto de pagamento aos trabalhadores envolvidos.
O cantor e sua defesa disseram que ele não tinha conhecimento das práticas de trabalho escravo. Saiba mais sobre o que diz Leonardo no vídeo abaixo e ao final da reportagem.
O g1 não encontrou o arrendatário da Fazenda Lakanka para se manifestar sobre o caso até a última atualização da reportagem.
Leonardo diz estar ‘muito triste’ após ser incluído na ‘lista suja’ do trabalho escravo
Entenda a rotina de trabalho
Segundo descrito pelos funcionários no relatório, o trabalho deles consistia em catar raízes para limpar uma área do terreno. A atividade envolvia a remoção de restos de árvores, raízes e outros materiais do solo para prepará-lo para o cultivo.
Em depoimento, eles disseram que cumpriam uma jornada diária que começava às 7h e terminava às 17h, com uma pausa de 1 hora para o almoço. Eles recebiam um pagamento fixo de R$ 150,00 por dia trabalhado.
A rotina funcionava da seguinte forma:
Acordavam às 5h40, deixavam o alojamento às 6h10;
Tomavam café perto da sede da fazenda, a cerca de 2km do alojamento;
O deslocamento até a área de trabalho era feito em um trator, onde os trabalhadores iam em pé na carreta;
Começavam a trabalhar às 7h da manhã;
O trabalho era realizado até as 11h30 ou meio-dia, quando faziam uma pausa para o almoço;
Depois de 1 hora de descanso, retornavam ao trabalho e trabalhavam até 17h, quando voltavam ao alojamento.
Os funcionários não recebiam pagamento nos dias em que não trabalhassem, fossem dias de folga ou em que não houvesse trabalho por algum outro motivo, inclusive se estivessem doentes.
Além disso, o documento diz que os catadores de raízes reportaram que, da última vez em que foram chamados a trabalhar, tinham sido informados que o trabalho aos domingos, quando paravam de trabalhar ao meio-dia, seria remunerado com meia diária, ou seja, R$ 75,00.
Mas alguns trabalhadores disseram que não era incomum trabalharem sete dias por semana, pois precisavam receber. Portanto, segundo o documento, eles não recebiam o descanso semanal que é garantido por lei.
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Segundo os fiscais, os catadores de raízes estavam completamente informais, ou seja, não tinham contratos de trabalho registrados e suas carteiras de trabalho não eram assinadas, o que fazia com que eles não tivessem benefícios e proteção trabalhista, como acesso a benefícios previdenciários.
A contratação e o pagamento dos catadores de raízes eram feitos por Leonardo por meio de outros funcionários, como os gerentes das fazendas. Um funcionário do arrendatário também coordenava as atividades de limpeza do solo, mas os fiscais entenderam que a responsabilidade final pelos trabalhadores e pelos pagamentos recaía sobre o cantor sertanejo.
Os outros 12 trabalhadores
Ao todo, a fiscalização identificou 18 trabalhadores nas fazenda Talismã e Lakanka. Seis foram resgatados em condições semelhantes às de trabalho escravo, e os outros 12 estavam em atividades diversas, como preparo do solo para o plantio de soja e manutenção de cercas.
Segundo o documento, apesar de também trabalharem de maneira informal, sem registro e direitos trabalhistas garantidos, as condições de vida e trabalho deles não foram consideradas tão degradantes a ponto de configurar uma situação de trabalho análogo ao de escravo.
Por que a Fazenda Talismã consta no relatório?
A Fazenda Talismã, avaliada em R$ 60 milhões, é citada porque, apesar dos trabalhadores resgatados estarem na Fazenda Lakanka, as duas fazendas estão fisicamente próximas e fazem parte do mesmo conjunto de operações agrícolas.
Além disso, o relatório explica que alguns dos trabalhadores encontrados na Fazenda Talismã estavam alojados em melhores condições do que os que foram resgatados da Fazenda Lakanka. Esse fato justifica a menção à Talismã, pois ela era parte da operação e empregava trabalhadores.
Outra razão de ambas as fazendas terem sido citadas pela fiscalização é que as duas estão sob o controle de Emival Eterno da Costa – nome de batismo do cantor Leonardo. O nome da fazenda Talismã homenageia um dos maiores sucessos da dupla Leandro e Leonardo, de 1990.
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Defesa diz que cantor ‘não era responsável’ por trabalhadores
Pedro Vaz, advogado do cantor Leonardo, falou ao g1 que a inclusão do nome do artista na “lista suja” causou “estranheza”. Isso porque, desde 22 de agosto de 2022, a área em questão está arrendada para outra pessoa realizar o cultivo de soja, não sendo, portanto, de responsabilidade de Leonardo a gestão dos funcionários envolvidos.
Segundo a defesa do cantor, quando o Ministério Público do Trabalho se manifestou, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi firmado, e “todos os problemas foram resolvidos”, mesmo sem serem de responsabilidade direta de Leonardo, dado o arrendamento da fazenda.
Também de acordo com o advogado, as indenizações devidas foram pagas, e o acordo proposto pelo Ministério Público foi aceito, resultando no arquivamento dos processos.
“Como a matrícula estava em nome do Leonardo, o Ministério Público do Trabalho propôs a ação. Na audiência, a gente apresentou o contrato de arrendamento e aí tudo foi esclarecido, mas pra que evitasse qualquer tipo de problema, nós pagamos todas as verbas indenizatórias naquele momento mesmo e tudo ficou sanado”, explicou Vaz.
A defesa de Leonardo informou que “estão sendo tomadas as medidas necessárias para remover o nome de Leonardo da lista mencionada”.
O Ministério do Trabalho e Emprego explicou que a “lista suja” é atualizada semestralmente e visa dar transparência aos atos administrativos decorrentes das ações fiscais de combate ao trabalho análogo à escravidão. A inclusão de pessoas físicas ou jurídicas na lista ocorre somente após a conclusão do processo administrativo que julga o auto específico de trabalho análogo à escravidão. O nome de cada empregador permanecerá publicado por um período de dois anos.
‘Jamais faria isso’
Cantor Leonardo é incluído pelo governo na ‘lista suja’ do trabalho escravo após fiscalização na Fazenda Lakanka, em Goiás
Montagem/g1
No mesmo dia em que a lista foi atualizada com seu nome, Leonardo usou as redes sociais para se manifestar sobre o assunto. O cantor lamentou a situação dizendo que não sabia do que estava acontecendo, já que arrendou a terra. Ele também reforçou que ‘jamais faria isso’.
“Surgiu um funcionário lá nessa fazenda que eu arrendei, que eu não conheço, nunca vi falar, nunca vi, e de repente eu fui visitado pelo Ministério Público do Trabalho, e foi lavrada uma multa pra mim, pra mim que sou o proprietário da fazenda”, afirmou.
“Gente, eu já plantei tomate, eu sei como é que é. A vida é difícil lá. Eu, do meu coração, jamais, jamais faria isso. Então, eu acho que há um equívoco muito grande sobre a minha pessoa. Eu não me misturo, eu não me misturo nessa lista aí que eles fizeram aí de trabalho escravo”, lamentou.
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Reprodução/Relatório Fotográfico da Inspeção
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Leonardo foi incluído na “lista suja” do ministério, divulgada na segunda-feira (7), após uma fiscalização resgatar seis trabalhadores em condições análogas à escravidão na Fazenda Lakanka, em Jussara, no noroeste goiano. Entre os resgatados, havia um adolescente de 17 anos de idade.
Os seis funcionários resgatados dormiam em uma casa abandonada, localizada a 2 quilômetros da sede da Fazenda Lakanka. Segundo os fiscais, o local era “precário”, sem banheiros e com camas improvisadas. Eles também identificaram infestação de morcegos e fezes.
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A fiscalização ocorreu em novembro de 2023 em duas fazendas: a Lakanka e a Talismã, que é avaliada em R$ 60 milhões. A segunda é citada porque, apesar de os trabalhadores resgatados estarem na Fazenda Lakanka, as duas ficam em área contígua e fazem parte do mesmo conjunto de operações agrícolas (veja detalhes mais abaixo).
Em nota ao g1, o Ministério Público do Trabalho confirmou que Leonardo já pagou as indenizações e o caso foi arquivado em abril deste ano. O cantor afirma que não sabia da situação até ser notificado pelas autoridades, pois a área fiscalizada está arrendada para outra pessoa.
Área arrendada
Os trabalhadores resgatados catavam raízes na Fazenda Lakanka, que está arrendada para outra pessoa. O arrendamento ocorre quando o proprietário de uma área – no caso Leonardo – cede o local para uso por meio do pagamento de um valor acordado.
O documento descreve que o cantor tinha como obrigação contratual entregar uma parte da Fazenda Lakanka pronta para o plantio, garantindo que o solo estivesse limpo e preparado. Já o arrendatário, segundo o documento, era responsável por executar o plantio e o manejo das atividades agrícolas uma vez que a área estivesse adequada para isso.
Por isso, embora o arrendatário tivesse responsabilidades sobre o plantio, as etapas de preparação do solo, como a catação de raízes e plantação de grama, ainda era de responsabilidade de Leonardo, tanto em termos de execução quanto de pagamento aos trabalhadores envolvidos.
O cantor e sua defesa disseram que ele não tinha conhecimento das práticas de trabalho escravo. Saiba mais sobre o que diz Leonardo no vídeo abaixo e ao final da reportagem.
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Entenda a rotina de trabalho
Segundo descrito pelos funcionários no relatório, o trabalho deles consistia em catar raízes para limpar uma área do terreno. A atividade envolvia a remoção de restos de árvores, raízes e outros materiais do solo para prepará-lo para o cultivo.
Em depoimento, eles disseram que cumpriam uma jornada diária que começava às 7h e terminava às 17h, com uma pausa de 1 hora para o almoço. Eles recebiam um pagamento fixo de R$ 150,00 por dia trabalhado.
A rotina funcionava da seguinte forma:
Acordavam às 5h40, deixavam o alojamento às 6h10;
Tomavam café perto da sede da fazenda, a cerca de 2km do alojamento;
O deslocamento até a área de trabalho era feito em um trator, onde os trabalhadores iam em pé na carreta;
Começavam a trabalhar às 7h da manhã;
O trabalho era realizado até as 11h30 ou meio-dia, quando faziam uma pausa para o almoço;
Depois de 1 hora de descanso, retornavam ao trabalho e trabalhavam até 17h, quando voltavam ao alojamento.
Os funcionários não recebiam pagamento nos dias em que não trabalhassem, fossem dias de folga ou em que não houvesse trabalho por algum outro motivo, inclusive se estivessem doentes.
Além disso, o documento diz que os catadores de raízes reportaram que, da última vez em que foram chamados a trabalhar, tinham sido informados que o trabalho aos domingos, quando paravam de trabalhar ao meio-dia, seria remunerado com meia diária, ou seja, R$ 75,00.
Mas alguns trabalhadores disseram que não era incomum trabalharem sete dias por semana, pois precisavam receber. Portanto, segundo o documento, eles não recebiam o descanso semanal que é garantido por lei.
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A contratação e o pagamento dos catadores de raízes eram feitos por Leonardo por meio de outros funcionários, como os gerentes das fazendas. Um funcionário do arrendatário também coordenava as atividades de limpeza do solo, mas os fiscais entenderam que a responsabilidade final pelos trabalhadores e pelos pagamentos recaía sobre o cantor sertanejo.
Os outros 12 trabalhadores
Ao todo, a fiscalização identificou 18 trabalhadores nas fazenda Talismã e Lakanka. Seis foram resgatados em condições semelhantes às de trabalho escravo, e os outros 12 estavam em atividades diversas, como preparo do solo para o plantio de soja e manutenção de cercas.
Segundo o documento, apesar de também trabalharem de maneira informal, sem registro e direitos trabalhistas garantidos, as condições de vida e trabalho deles não foram consideradas tão degradantes a ponto de configurar uma situação de trabalho análogo ao de escravo.
Por que a Fazenda Talismã consta no relatório?
A Fazenda Talismã, avaliada em R$ 60 milhões, é citada porque, apesar dos trabalhadores resgatados estarem na Fazenda Lakanka, as duas fazendas estão fisicamente próximas e fazem parte do mesmo conjunto de operações agrícolas.
Além disso, o relatório explica que alguns dos trabalhadores encontrados na Fazenda Talismã estavam alojados em melhores condições do que os que foram resgatados da Fazenda Lakanka. Esse fato justifica a menção à Talismã, pois ela era parte da operação e empregava trabalhadores.
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Também de acordo com o advogado, as indenizações devidas foram pagas, e o acordo proposto pelo Ministério Público foi aceito, resultando no arquivamento dos processos.
“Como a matrícula estava em nome do Leonardo, o Ministério Público do Trabalho propôs a ação. Na audiência, a gente apresentou o contrato de arrendamento e aí tudo foi esclarecido, mas pra que evitasse qualquer tipo de problema, nós pagamos todas as verbas indenizatórias naquele momento mesmo e tudo ficou sanado”, explicou Vaz.
A defesa de Leonardo informou que “estão sendo tomadas as medidas necessárias para remover o nome de Leonardo da lista mencionada”.
O Ministério do Trabalho e Emprego explicou que a “lista suja” é atualizada semestralmente e visa dar transparência aos atos administrativos decorrentes das ações fiscais de combate ao trabalho análogo à escravidão. A inclusão de pessoas físicas ou jurídicas na lista ocorre somente após a conclusão do processo administrativo que julga o auto específico de trabalho análogo à escravidão. O nome de cada empregador permanecerá publicado por um período de dois anos.
‘Jamais faria isso’
Cantor Leonardo é incluído pelo governo na ‘lista suja’ do trabalho escravo após fiscalização na Fazenda Lakanka, em Goiás
Montagem/g1
No mesmo dia em que a lista foi atualizada com seu nome, Leonardo usou as redes sociais para se manifestar sobre o assunto. O cantor lamentou a situação dizendo que não sabia do que estava acontecendo, já que arrendou a terra. Ele também reforçou que ‘jamais faria isso’.
“Surgiu um funcionário lá nessa fazenda que eu arrendei, que eu não conheço, nunca vi falar, nunca vi, e de repente eu fui visitado pelo Ministério Público do Trabalho, e foi lavrada uma multa pra mim, pra mim que sou o proprietário da fazenda”, afirmou.
“Gente, eu já plantei tomate, eu sei como é que é. A vida é difícil lá. Eu, do meu coração, jamais, jamais faria isso. Então, eu acho que há um equívoco muito grande sobre a minha pessoa. Eu não me misturo, eu não me misturo nessa lista aí que eles fizeram aí de trabalho escravo”, lamentou.
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Postado em: 02:03